Declaração Política
Deputado Bruno Dias


Arsenal do Alfeite


22JUL09


Senhor Presidente,


Senhoras e Senhores Deputados,


A situação gravíssima do Arsenal do Alfeite e dos seus trabalhadores no momento actual constitui, pelas piores razões, um retrato paradigmático do que têm sido as políticas, as opções de classe e a actuação deste Governo PS/Sócrates.
Está em curso uma vergonhosa operação de desmantelamento de postos de trabalho e de ataque aos direitos, definida e concretizada por ordem do Governo, sob o manto diáfano do processo de “empresarialização do Arsenal”.


Primeiro, o Governo extingue o Arsenal do Alfeite como estaleiro público, ligado à Marinha Portuguesa. Decide colocar na prateleira da “mobilidade especial” (forma de despedimento encapotado) centenas de trabalhadores. Constitui uma Sociedade Anónima, a Arsenal SA, para onde transitam os trabalhadores que a Administração quiser.
Mas transitam no quadro de um “Acordo de Cedência de Interesse Público”, com um regime laboral em que, para uma larga parte dos aspectos, a norma é o Código do Trabalho, nivelando por baixo os direitos dos trabalhadores.


O Governo vem dizendo que há muitos direitos e situações actuais que se mantêm – mas mantêm-se por prazos de três meses… até um dia!
É que a inaceitável situação que está apontada é a da precarização dos vínculos, negando aos trabalhadores o direito à estabilidade no emprego. Os trabalhadores passariam a viver, pensando o futuro a 90 dias! Porque em cada 90 dias, estes trabalhadores podem ser “dispensados” tranquilamente, discricionariamente, abrindo um caminho muito fácil aos famosos “outsourcings”.
No limite, desenha-se um quadro com uma empresa que até poderia simplesmente deixar de ter trabalhadores efectivos.

Importa recordar, para os mais esquecidos, a decisão recente do Tribunal Constitucional, que declarou inconstitucional a norma do Código do Trabalho que previa o “período experimental” de 90 dias, por conflituar com o direito constitucionalmente consagrado à segurança e estabilidade no emprego. Agora o Governo quer colocar estes trabalhadores numa situação de insegurança, com uma intolerável ameaça sobre o seu futuro.
Durante muito tempo, a tese oficial que foi difundida era a da «rentabilização da capacidade instalada» no Arsenal, da «diversificação de encomendas» aproveitando os recursos não utilizados ao serviço da Marinha.


Mas o que a actuação e as decisões concretas do Governo vieram demonstrar foi a absoluta falsidade desta ideia que se veiculou durante meses a fio. Rapidamente se constatou que o verdadeiro objectivo era extinguir postos de trabalho e retirar direitos aos trabalhadores.
Na semana passada, deslocámo-nos ao Arsenal do Alfeite para conhecer directamente a situação actual e a sua evolução. E da boca de um alto responsável na condução deste processo, ouvimos pessoalmente a frase que esclarece qualquer dúvida: «na rua está a malta – nós estamos a meter pessoal!»
Está tudo dito: a tal “empresarialização” mais não é senão “pôr a malta na rua”. Depois, é só contratar com as condições que unilateralmente a Administração (entenda-se, o Governo) quiser impor aos trabalhadores.
É uma intolerável chantagem que está a ser movida aos arsenalistas, inclusive com a Administração a distribuir documentos para serem individualmente assinados pelos trabalhadores, que têm de aceitar as condições que lhes derem, independentemente de qualquer negociação.


Senhor Presidente e Senhores Deputados,


O que está a acontecer não resulta de um desvio de percurso, ou de uma opção errada de algum quadro intermédio. O que está a acontecer é o resultado directo de uma determinação e opção política do Governo. Está tudo conforme planeado.
Com esta actuação, o Governo assume com toda a crueza e empenhamento o papel indigno da destruição directo de postos de trabalho no Arsenal do Alfeite.

Neste contexto social e económico de crise, de recessão e de desemprego que o país atravessa, é esta verdadeiramente a marca da governação PS/Sócrates.
A responsabilidade política directa deste Governo, face à situação vergonhosa que se está a passar, tem de ser plenamente assumida, porque ainda é possível, e urgente, e indispensável, fazer com este processo seja corrigido e os direitos dos trabalhadores sejam garantidos.
Há algum tempo, num debate nesta mesma sala, o Senhor Ministro dos Assuntos Parlamentares virou-se para os deputados do PCP e, pensando que assim nos atacava, afirmou que a nossa posição política tinha «uma lógica de Arsenal do Alfeite».


Estava feita a afirmação clara, que a prática política veio confirmar, que o Governo PS quer ser do tempo e da «lógica» da precariedade e do desemprego, da submissão nacional ao poder económico, da fragilização das próprias estruturas de apoio à Marinha Portuguesa.
Pela parte do PCP, nós somos – e queremos continuar a ser – do tempo do Arsenal do Alfeite. Somos do tempo do trabalho, da produção de riqueza, do desenvolvimento, do emprego com direitos e melhores salários, da soberania e da independência nacional.
E queremos ser do tempo da formação e da valorização dos trabalhadores. Queremos ser do tempo dos novos projectos, do avanço tecnológico, da modernização do Arsenal, digna desse nome. Principalmente, somos e queremos ser do tempo do Arsenal do Alfeite cumprindo plenamente o seu papel como estaleiro público, integrado na Marinha Portuguesa, ao serviço do nosso povo e do nosso país.


Esse tempo é possível. Esse país é possível. E surgirá da mudança que será construída com a ruptura de políticas, com a concretização de uma política de esquerda, com o cumprir da palavra dada, com a opção firme pela defesa dos direitos de quem trabalha. Mas também com a luta – a luta dos arsenalistas e de todos os trabalhadores, com a sua unidade na acção, firme e determinada, em defesa dos direitos.Lá no Arsenal junto ao Tejo, em frente à Administração, lá no “portão verde” em Almada, aqui junto ao Parlamento, ao Ministério da Defesa, ao Conselho de Ministros, à Presidência da República, a luta dos trabalhadores Arsenalistas nunca parou – e continua na actualidade. Em todos os momentos, o PCP sempre lá esteve, e continuará a estar ao seu lado.
A nossa mensagem é afinal muito simples: a vida não tem de ser assim. A política não tem de ser assim. Há um outro caminho que é possível seguir, para uma vida melhor, mais justa. E a nossa confiança no futuro, a nossa esperança que não fica à espera, assenta precisamente na confiança que temos nos trabalhadores e no povo, que construirão o futuro com as suas lutas. E nessas lutas, sabemos muito bem de que lado estamos.


Disse.